quinta-feira, dezembro 29, 2016




Doutora Maria Cristina Januário Santos

O título académico de agregado atesta, num ramo do conhecimento ou sua especialidade, a qualidade do currículo académico profissional, científico e pedagógico bem como a capacidade para investigação e a aptidão para dirigir e realizar trabalho científico e independente.”
É assim com estas palavras e com este entendimento algo “simplista e básico” na legislação vigente que nos temos de confrontar ou conformar na elaboração do parecer que me foi requerido pelo digníssimo Presidente do Júri das provas de Agregação da candidata Doutora Maria Cristina Januário Santos.
O Decreto vai mais longe definindo mesmo, aritmeticamente, o que deve ser considerado pelo Júri no julgamento das tais qualidades, aptidão e capacidades atrás enunciadas.
Assim:
Ponto 1, “Publicação de, no mínimo, quinze artigos científicos em revistas indexadas Thomson Reuters (ISI) Web of Knowledge. Oito destes artigos, deverão ter sido publicados após a obtenção do grau de doutor, e situar-se nos Quartis 1, 2 ou 3 do Journal Citation Reports, da ordenação ISI da respectiva área científica. Do total de artigos do candidato, cinco deverão ter sido publicados nos últimos cinco anos e oito como primeiro, segundo ou último autor”.
Quer se critique ou não esta “exigência mínima”, aritmética e um pouco ad latere do que consideramos que deveria ser uma avaliação académica, certo é que a candidata a excedeu largamente. Senão vejamos:
            Número de publicações 61 (400% do exigido)        
            Últimos 5 anos 22 (275%) - sendo 10 quartil 1, 5 quartil 2 e os restantes do          quartil 3 (Journal Citation Reports)
                                                      
Como o doutoramento decorreu há 5 anos estes números respondem, em parte, ao exigido no ponto 2 (“Do total de artigos do candidato, cinco deverão ter sido publicados nos últimos cinco anos e oito como primeiro, segundo ou último autor”).
                                                    
Mas demonstrando uma inesperada complacência legislativa, diz ainda o citado decreto no seu número 3: “Em alternativa ao estipulado no ponto 1 ter um total de 200 citações e um somatório de fator de impacto (IF) igual ou superior a 50, bem como um número total de publicações não inferior a 10.”
Mesmo não necessitando, a Doutora Maria Cristina Januário Santos, deste critério de repescagem, ainda assim o seu CV a ele corresponde afirmativamente:

Número de citações 1372 (686%)
Factor de impacto: 227.193 (474%)

Numa perspectiva mais Universitária, mas mesmo assim sem prescindir da obsessão aritmética, o número 4 do decreto exige a “Orientação, no mínimo, de uma dissertação de doutoramento e 10 dissertações de Mestrado ou Mestrado Integrado.”
Mais uma vez o CV da candidata se mostra conforme a exigência:
                       
2 dissertações Doutoramento e 1 em co-orientação (CV pag 10) (200%)
20 dissertações de Mestrado Integrado, das quais 4 em co-orientação (pag. 6 e 7 do CV) (200%)


Levar-nos-ia muito longe a discussão dos fundamentos e importância do artigo 5º do presente decreto: (“participação como investigador em pelo menos um projecto financiado”) quando se discute a relevância, a evidência, a intencionalidade e a justeza de muitos destes subsídios e bolsas concedidos num passado próximo.
Mas, apesar dessas vicissitudes e interesses que têm menorizado as àreas clínicas, a candidata ultrapassa em 2.300% o mínimo exigível. Mesmo não contando com os ensaios clínicos de fase II e III que o Sr. Ministro da Ciência recentemente considerou, algo apressadamente na minha modesta opinião, não poderem ser considerados como trabalho científico, mas que talvez por descuido ainda se encontram plasmados no referido decreto.

-      Na área da Doença Machado Joseph – três projectos com financiamento – (CV pag 13)
-      Na área da Doença de Huntington – três projectos na European Huntington   Disease Network        (Euro-HD), Investigador Principal em Coimbra (CV pag   13)
-      Na área de Doenças do Movimento e Gânglios da Base - mais de 17 projectos FCT, GAI.. (CV pag 14 e 15)
-      Na Investigação clínica participou em todos os ensaios clínicos na DP e HD realizados no centro (cerca de 30) sendo PI nos últimos anos em 3. (CV Pag 16- 18)

Cumpre assim a candidata todos os critérios numéricos exigidos no citado decreto.
Mas penso que para avaliar o seu verdadeiro mérito para um título de agregado aquelas exigências numéricas, não sendo displicentes e tendo sido largamente ultrapassadas pela Doutora Maria Cristina Januário Santos, não são suficientes para definir nem mesmo descrever as suas qualidades académicas.

Destaco a sua excelente carreira médica hospitalar que a conduziu, ainda em 2002, ao lugar de Chefe de Serviço de Neurologia, um dos 4 existentes no Serviço de Neurologia do Centro Hospitalar e Universitário de Coimbra. O que diz muito não apenas da sua competência técnica como da sua capacidade para formar elementos, integrá-los em equipas e coordená-los com grande eficiência. Condições necessárias à ascensão a este grau e nem sempre cumpridas por outros candidatos mesmo recentes. Aqui ficam alguns exemplos dessa actividade:
- Coordenadora da Consulta de Doenças do Movimento desde 1991.
- Coordenadora da Consulta de Doenças Neurogenéticas, que fundou em 2000.
- Coordenadora do sector de Internamento Neurologia B desde 2015.
Mas tem também a candidata obtido o reconhecimento dos seus pares a nível internacional como demonstram os seguintes factos:
- Em 2016 integrou como investigador clínico principal o Grupo Europeu para o Estudo das Atáxias, ESMI: European Spinocerebellar Ataxia Type 3/Machado-Joseph Disease Initiative.
- Investigador Principal do Estudo Observacional Registry e dos sub estudos; Registry Quality of Life; Registry Young Huntington’s Disease da Rede Europeia “Huntington Disease Euro-HD”
- Prémio “The Michael J. Fox Foundation for Parkinson’s Research - 2013
- Prémio Flad Life Science 2020
- Prémio Neurociências Mantero Belard 2013
Foi também reconhecida a sua importância a nível nacional ocupando cargos directivos de que destaco:
 - Direção da Sociedade Portuguesa de Neurologia 2005- 2007- Vice Presidente
             - Direção da Secção de Doenças do Movimento da Sociedade Portuguesa de Neurologia
             - Vice Presidente - 1996- 2000
             - Presidente - 2004- 2007
Tem igualmente uma grande experiência como docente, não só na vertente prática que é, (como sempre deveria ser considerada nestes casos) uma extensão da sua excelente actividade clínica, na vertente teórica, sendo igualmente um dos 3 docentes seniores que asseguram o ensino teórico-prático (parte essencial do ensino da Neurologia).
A candidata Doutora Cristina Januário Santos é assim um dos últimos exemplos de como deveria ser o percurso de um doutorado e agregado de uma cadeira clínica. Começando por uma carreira notável na área clínica, que foi entrelaçando com a investigação necessária às questões que os doentes lhe levantavam, articulando-se quando necessário com a ciência básica (transmitindo-lhe o realismo e a visão de um clínico nem sempre presente noutras circunstâncias) ao mesmo tempo que ía ensinando, os seus internos formando equipas coesas e competentes, e as centenas de alunos com os quais contactou.
Apesar de esta intensa actividade, teve oportunidade de construir um CV científico que compara e ultrapassa com frequência aquilo que é exigível legalmente (e se tornou a norma da actual cadeia de produção de doutorados), ser reconhecida como referência nacional e internacional na sua área.
Por todas estas razões, que seriam suficientes, mas mais ainda pela diferença, pelo exemplo, pela qualidade e pelo reconhecimento do seu trabalho, o meu parecer apenas podia ser positivo recomendando mesmo pessoalmente a candidata para o título de agregação a que concorre.


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Professor Doutor Luis Augusto Salgueiro e Cunha

Coimbra, 29 de Dezembro de 2016


quinta-feira, dezembro 01, 2016

I, DANIEL BLAKE
http://www.imdb.com/title/tt5168192/

Quatro pessoas na sala de cinema. Que passa este filme apenas uma vez por dia. No entanto...tem tanto de atual como de profético. Um país em que o serviço nacional de saúde ainda funciona no limite, com a competência e um resto de humanismo dos médicos. Afundado em inoperância na relação com a segurança social, entregue a privados, escondidos atrás de regulamentos, linhas de atendimento e filtros digitais e suportado pelos insensíveis burocratas menores que não tiveram lugar na política.
Está a pensar na América de Trump? Desiluda-se, passa-se na Europa, ainda na CE, em que orçamentos e multinacionais e bancos e políticos estão destruindo todo o estado social que era a sua melhor herança. Só quatro pessoas se encontravam na sala...